sexta-feira, junho 16, 2006

O guardião do genoma


Esta é uma das designações para a proteína p53 (representada na figura) devido ao seu papel múltiplo na regulação do ciclo celular, na morte celular programada (apoptose) e na manutenção da estabilidade genética. Em cerca de metade dos cancros humanos o gene que codifica esta proteína está mutado (daí a classificação em gene supressor de tumores). Basicamente, esta proteína participa na verificação do bom estado do genoma, fazendo com que, se não há erros detectados, a célula progrida no ciclo celular (entrada na fase S - de síntese de DNA). Deste modo tudo corre bem; o DNA está em bom estado, logo pode ser replicado para a célula se dividir e a informação genética das duas células formadas ser igual. Se há erros no DNA, a p53 participa na paragem do ciclo celular, permitindo a actuação dos mecanismos moleculares de reparação de danos de DNA. Se estes não repararem o DNA (em caso de danos extensos, por exemplo), então a p53 participa na indução da apoptose, ficando o organismo livre daquele problema.

Uma das características das células tumorais é a de basearem o metabolismo energético na glicólise em vez de procederem à respiração. Com isto ganham vantagem em relação às células não tumorais, pois, apesar de ser um processo menos eficiente energeticamente, a glicólise permite a disponibilização de energia (ATP) rapidamente para um desenvolvimento rápido (o chamado efeito Warburg). As leveduras têm um efeito semelhante (efeito Crabtree) que é caracterizado pela realização de fermentação (alcoólica) mesmo na presença de oxigénio. Aqui também há uma vantagem na competição por nutrientes, por exemplo em mostos de vinhos, em que a população microbiana é diversa. A Saccharomyces cerevisiae usa a esperteza de fermentar rapidamente os açúcares, diminuindo a sua disponibilidade para outros microrganismos que os poderiam respirar e, simultaneamente, produzir o veneno etanol que toleram melhor que os outros.

Tudo isto vem a propósito da publicação na Science de um trabalho em que se apresenta uma relação entre a p53 e respiração mitocondrial. Matoba e colaboradores observaram que a inactivação do gene SCO2, um regulador do complexo citocromo c oxidase (essencial para a respiração aeróbia nas mitocôndrias) provoca o mesmo desvio no metabolismo energético que a inactivação do gene que codifica para a p53. Cá está, mais um processo em que a p53 estará envolvida: regulação do efeito Warburg. Na verdade, isto está tudo ligado uma vez que a apoptose pode ser induzida por sinais endógenos como a libertação da citocromo c oxidase das mitocôndrias.

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