domingo, dezembro 30, 2007

Eles andam por aí?

Um artigo interessantíssimo na Scientific American de Novembro sobre a possibilidade de haver formas de vida de origens independentes na própria Terra, verdadeiros aliens da Terra.

Se há determinismo biológico, então pode-se procurar vida extraterrestre na Terra, pois, nesse caso, a vida deverá ter surgido mais do que uma vez. A possibilidade de seres de uma origem serem eliminados por seres de outra origem não será provável pois se são origens de vida em locais com características diferentes, os seres resultantes de cada uma não iriam partilhar nichos ecológicos, logo, não competiriam entre si. Como exemplo (sem se tratar, obviamente, de aliens), pode-se referir a existência simultânea das arquebactérias associadas a ambientes extremos e as eubactérias mais normais em termos de habitat.

Se eles estão entre nós, e se são micróbios, então é muito difícil identificá-los. A morfologia é uma característica com baixo poder discriminatório e os métodos para detecção de formas de vida baseiam-se nas formas de vida que nós conhecemos (DNA, RNA, proteínas, tipo de metabolismo, etc), ou seja, os extraterrestres podem estar na amostra debaixo dos nossos narizes mas não os conseguimos detectar (este problema pode ter acontecido e ainda ocorrer em Marte). No artigo são discutidas algumas possibilidades de alternativas metabólicas e químicas para estes aliens. Um exemplo incrível é o Anaerovirgula multivorans um microrganismo com a capacidade absolutamente extraordinária de digerir nutrientes espelho (a conformação química é a imagem no espelho como por exemplo aminoácidos D em vez da forma L biologicamente universal, que não são utilizáveis por não terem capacidade de se ligar ao centro activo das enzimas do metabolismo). Este promissor alien afinal revelou-se um nosso companheiro de origem de vida, pois o seu metabolismo baseia-se em compostos com a mesma conformação dos restantes seres. A diferença é que antes de os metabolizar, converte os compostos espelho nas formas usuais (provavelmente com enzimas específicas para esta tarefa).

sábado, dezembro 29, 2007

"Extraterrestres" que não são micróbios

Via Living the scientific life, um vídeo com imagens de seres das profundezas oceânicas com aspecto extraterrestre. Enfim, alguns não são nada estranhos, mas aqueles pulsos de luz que emitem são deslumbrantes. Naquela escuridão a única luz é a de origem biológica.

terça-feira, dezembro 18, 2007

Passado húmido em Marte


A marca das rodas do Spirit revelou solo rico em sílica cuja origem pode ser associada a fontes hidrotermais. A novela da vida em Marte é daquelas de enredo prolongado.
Foto: Robert Nemiroff (MTU) & Jerry Bonnell (UMCP); APOD

quarta-feira, novembro 21, 2007

"They are probably more clinically relevant than embryonic stem cells"

Os tecidos personalizados estão mais próximos de se tornarem realidade (notícias aqui e aqui). Com a introdução de 4 genes codificando para factores de transcrição foi possível induzir células da pele em células estaminais. Apenas a manipulação de factores de transcrição permitiu fazer esta alteração (para mais tarde fica o comentário a estes factores, assim que tiver acesso aos artigos).

Aparentemente, as células são mais fáceis de manipular do que se poderia imaginar. Se calhar é só "mexer" nos sítios certos!

quarta-feira, novembro 14, 2007

A insónia de Michael Palin


Um estudo de caracterização fisiológica e bioquímica da adaptação dos tibetanos à altitude acaba de ser publicado (ver comentário aqui). Uma das adaptações tem que ver com a produção elevada de óxido nítrico causando vasodilatação e maior fluxo sanguíneo. Outra das adaptações dos tibetanos é a elevada quantidade de antioxidantes no organismo, que poderá estar relacionada com o potencial oxidante do óxido nítrico. Outro dado interessante é a elevada pressão sanguínea sem desenvolvimento de doenças cardiovasculares. Um aspecto interessante do estudo é o de salientar a relevância de factores vasculares nesta adaptação em detrimento dos "tradicionais" factores hematológicos e pulmonares. Naturalmente, na capacidade respiratória os tibetanos são campeões. Afinal, este povo vive a 4500m de altitude! Quando Michael Palin realizou no Tibete uma parte das suas viagens na Ásia, houve um episódio em que não conseguia dormir porque inconscientemente estava a fazer uma frequência elevadíssima de inspirações e expirações, compensando o facto de ser um organismo do "nível do mar" a respirar o ar rarefeito dos 4500m de altitude.

sexta-feira, outubro 05, 2007

"What's true for E. coli is true for an elephant"


Foto: biomorfos de R. Dawkins
Se não temos uma definição do que é vida como é que poderemos encontrar vida fora da Terra? E como é que poderemos definir correctamente vida se não temos um exemplo de vida extraterrestre (afinal, as formas de vida terrenas são todas à base dos mesmos modelos celulares e moleculares; foi Monod quem o disse "What's true for E. coli is true for an elephant.")

Na Seed , Carl Zimmer acaba de publicar um artigo sobre a problemática da definição de vida. Muito interessante a contribuição de filósofas como Carol Cleland da Universidade do Colorado. Sem a comparação com formas de vida não convencionais, como serão presumivelmente as extraterrestres
(vida não darwiniana como por exemplo células com enzimas mas sem genes que se poderiam reproduzir por divisão), é muito difícil encontrar as características típicas de vida. Não será preciso sair da Terra para as encontrar num futuro próximo. Há muito trabalho já feito na área da biologia sintética. Vida sintética seria possível com um conjunto de genes essenciais à vida (Craig Venter outra vez) e vida sintética com base em RNA (Jack Szostak de Harvard Medical School).

A referência à obra seminal de Schrodinger não poderia obviamente ser evitada neste artigo. "What is life?", como é recordado por Zimmer, influenciou Watson e Crick (o DNA como um cristal aperiódico) e a futura disciplina científica Biologia Molecular.

Estranhos seres vivos do planeta Terra: Conan a Bactéria


Um herói, este Deinococcus radiodurans ou, como também é conhecido, "Conan a Bactéria". A alcunha (e o seu nome de espécie) não poderia ser mais apropriada. Algumas propriedades: suporta 3000 vezes mais radiação do que aquela suficiente para matar um ser humano, suporta condições extremas de secura, UV e stresse oxidativo. Por isso é classifcado como um poliextremófilo. Agora algumas das características do seu genoma/proteoma: o número mais elevado de proteínas não relacionadas filogeneticamente com outros organismos, com 19 famílias de proteínas únicas; elevada quantidade de sequências repetitivas; e tem quatro elementos cromossómicos em vez de um apenas como é comum em bactérias.

A capacidade de resistência a doses elevadas de radiação parece estar relacionada com o mecanismo de reparação de DNA que faz a montagem do genoma após fragmentação por radiação ionizante em doses elevadas. Craig Venter parece que já está a tentar explorar a capacidade de reparação de DNA desta bactéria para fazer Biologia Sintética.

Se há extraterrestres na Terra, aposto que é este.

terça-feira, setembro 25, 2007

Eis o Outono

Foto: NASA
Já me estou a repetir (no ano passado coloquei no Blogómica uma foto semelhante), mas não resisto a estas manifestações da biosfera que são visíveis do espaço.

sábado, agosto 18, 2007

O que é que a moral tem que ver com a ecologia e democracia?

Estes "meninos" deviam cruzar o seu genoma com o das bactérias, leveduras, moscas, ratos e outros para verem que não são assim tão especiais. O genoma sacrado deles é porventura menos digno que o do milho transgénico que querem combater que, pelo menos, não permite este tipo de barbaridades. Dou mais crédito a estes seres de que se diz serem transgénicos do que a pessoas que dizem ser seu objectivo "estabelecer a ordem ecológica, moral e democrática". Daqui não vem coisa boa de certeza, ao contrário dos transgénicos.

PS (post scriptum): este país é mesmo uma república das bananas; como é que a GNR permite este tipo de vandalismo nas suas barbas!

quarta-feira, agosto 08, 2007

Raios cósmicos no DNA

Uma questão interessante sobre os danos de DNA induzidos por radiação é a sua distribuição na cromatina da célula atingida. Quando a radiação atinge o núcleo duma célula, o seu percurso é linear e os danos provocados pela sua passagem seriam constantes ao longo do seu trajecto (danos aleatórios) ou, pelo contrário, haveria uma distribuição não uniforme de danos nessa linha (danos não aleatórios). O que acaba de ser divulgado por Sylvain Costes e colaboradores corresponde a um pouco das duas situações. Com dados obtidos por electroforese em campo pulsado, microscopia de fluorescência (em que proteínas de reparação estão marcadas com fluorocromos) e uma análise da densidade de DNA no núcleo conseguiram determinar que os locais de reparação activa de DNA situam-se preferencialmente na eucromatina (especificamente na interface heterocromatina/eucromatina). Em termos físicos não há razões para que uma molécula (DNA) seja mais susceptível à radiação em determinadas regiões, considerando que este composto contém apenas 4 tipos diferentes de constituintes químicos (os nucleótidos A, T, G e C). Como a localização desses locais de reparação activa variou com o tempo após a exposição à radiação, a explicação avançada foi a de que os locais com danos são transferidos para as regiões menos densas em cromatina. Isto faz sentido pois, para a reparação, é preciso a actuação de enzimas que usam o DNA como substrato. Se o DNA estivesse compactado, as cadeias de nucleótidos não estariam à disposição para as modificações químicas. Aliás, a transcrição ocorre sempre em DNA descondensado, por fazer parte da eucromatina ou, caso contrário, por ser localmente descondensado. Ou seja, os danos são de facto aleatórios mas a distribuição posterior desses danos deixa de o ser uma vez que a cromatina tem um comportamento dinâmico de modo a permitir a reparação dos danos nas regiões menos condensadas.

Este trabalho tem a colaboração da NASA por motivos óbvios. Missões tripuladas a planetas próximos como Marte provocarão a exposição de seres humanos aos raios cósmicos durante mais de 3 anos. O trabalho publicado baseia-se na utilização de um modelo matemático que converte dados experimentais em imagens artificiais de microscopia.

segunda-feira, julho 23, 2007

A morte é certa

Envelhecer pode ser a mesma coisa para a Levedura (Saccharomyces cerevisiae), verme (Caenorhabditis elegans) e rato (Mus musculus), pelo menos a nível celular e molecular. Estes são os modelos experimentais mais usados em estudos de envelhecimento. Enquanto que o rato e, vá lá, o verme parecem ser próximos dos humanos (somos todos multicelulares), o caso das leveduras já será de estranhar. O que é que será envelhecer para um micróbio? O caso da apoptose é paradigmático. Os resultados que se obtêm com um determinado modelo experimental são, obviamente, condicionados pelo próprio modelo. Por isso, perante dados que apontam para a morte celular programada em leveduras, surge sempre a questão do significado biológico, sendo difícil de explicar a selecção desta característica em micróbios por falta duma vantagem conferida a um indivíduo que se suicida sem haver vantagem aparente para si (claro). No entanto são detectadas caspases e outros marcadores de apoptose em leveduras. É claro, que há sempre o argumento válido da vantagem da apoptose em micróbios estar por descobrir, sendo subtil quando comparada com a vantagem da apoptose em multicelulares pela vantagem do organismo em eliminar células com problemas genéticos.

O envelhecimento é bem mais fácil de explicar em micróbios, pois como qualquer ser vivo, estão sujeitos a degradação dos seus componentes (macromoléculas, organelos), deficiência funcional e, por fim, inviabilidade. O que é interessante é que a nível celular e molecular este processo parece ser extremamente bem conservado desde leveduras a humanos. Há trabalho publicado identificando o papel fundamental das mitocôndrias e o estado de oxidação das macromoléculas. Genes envolvidos em vias de regulação de utilização de glucose são homólogos na levedura, verme e mamíferos, sendo a sua inactivação resultante num prolongamento da longevidade (daí a célebre restrição calórica para prolongar a vida). Em comum também há genes envolvidos na resistência a stresse oxidativo. O caso da levedura é espectacular pois o aumento da longevidade pode ser até 3 vezes mais por activação de genes de resistência a stresse oxidativo (em simultâneo com a inactivação dos genes de consumo da glucose).

Em levedura estudam-se dois tipos de idade: idade cronológica medida pela capacidade das células manterem viabilidade quando se encontram em culturas em que a fonte de carbono e energia já se esgotou e a idade replicativa medida pelo número de células descendentes que produzem. Aqui a analogia com os humanos também é aplicada. Enquanto que a idade cronológica tem que ver com o envelhecimento das células do organismo humano adulto (em situações normais a maior parte delas em situação pós-mitótica (fase G0), a idade replicativa é análoga à viabilidade das células estaminais (as tais que fazem sempre mitoses para produzir novas células diferenciadas).

segunda-feira, julho 09, 2007

Selecção darwiniana em células artificiais

Não são verdadeiramente células mas gotículas aquosas, contendo um sistema de transcrição/tradução completo, dispersas num meio oleoso. Se cada uma destas "células" contiver um clone dum banco genómico, então em cada uma haverá expressão do(s) gene(s) correspondentes apenas a esse clone. Ou seja, neste sistema, cada gotícula distingue-se pelo seu genótipo cujo fenótipo poderá ser aproveitado para enriquecer a população em genes que codificam para proteínas específicas.

Zheng e Roberts da New England Biolabs (empresa de referência de reagentes para biologia molecular, particularmente em enzimas de restrição) usaram este sistema para seleccionar genes codificantes para enzimas de restrição. Como as enzimas de restrição cortam DNA em locais específicos, deixando extremidades nas moléculas que são compatíveis para ligação, o fenótipo é a quebra do DNA em que as suas extremidades são conhecidas; por expressão do gene na gotícula que codifica para a enzima de restrição, produz-se a proteína activa que, obviamente, vai cortar o "seu" gene. Ora isto só acontece nas gotículas que contêm esse gene. Assim, isolando o DNA total de todas as gotículas, Zheng e Roberts fizeram a reacção de ligação com adaptadores de DNA específicos para os fragmentos obtidos por acção da enzima de restrição (PstI, no caso). Posteriormente, fizeram PCR específico para esses adaptadores. Deste modo, amplificaram apenas o gene da PstI. Em 2-3 ciclos de expressão, isolamento de DNA, ligação com adaptadores e PCR conseguiram fazer com que esse gene fosse a única molécula de DNA no sistema.

Tomando a analogia com Darwin ao extremo, este sistema poderá ter aplicações no melhoramento de moléculas úteis em biotecnologia. É só desenhar um modelo de selecção conveniente e simples. Creio que Darwin nunca sonhou com selecção natural molecular.

segunda-feira, julho 02, 2007

Blake and Mortimer


Partilho com Pacheco Pereira um dos livros da sua vida, O Enigma da Atlântida do belga Edgar P. Jacobs que fui acompanhando, semana a semana, através da extinta revista Tintin. O primeiro que li, e que mais me marcou, foi A Marca Amarela. Talvez tenha sido por isso, mas foi certamente por ter sido publicada na Tintin a versão a preto e branco que realçava o lado obscuro de Londres permanentemente submersa em nevoeiro com que se confundia, vestido completamente de negro, o eterno rival da dupla de heróis: Olrik. Está lá a Londres da história de Jack o estripador e dos filmes do período britânico de Hitchcock. O clima da ameaça sobre a cidade (mais actual que nunca) é único.

domingo, julho 01, 2007

Avery MacLeod McCarty, parte II?

Craig Venter acaba de anunciar a transformação de uma espécie noutra por transplantação do cromossoma de Mycoplasma mycoides em Mycoplasma capricolum. Isto é, M. capricolum passou a ser M. mycoides, tendo em conta a análise feita com recurso a anticorpos específicos de proteínas membranares de M. mycoides e por métodos bioquímicos (detecção e identificação de proteínas por electroforese bidimensional). É claro que o objectivo não foi o mesmo de Avery, MacLeod e McCarty, agora trata-se de fazer genómica sintética. E isto vai dar muito que falar!

sábado, junho 30, 2007

Sinal dos tempos?

O facilitismo e politização da ciência denunciados por um professor britânico. Como ele diz, quando é assim não é ciência.

Não é só por cá...

(via http://www.openscience.org/blog/)

sexta-feira, junho 29, 2007

Acreditem, não tenho palavras...

Já tem alguns meses e é uma estupidez pegada, mas não resisto! O tom sensacionalista por vezes assemelha-se à realidade.

quinta-feira, junho 28, 2007

Farmácias em seres vivos

O que é que faz supor que um organismo poderá ser útil para um determinado fim? Que propriedades deve manifestar um organismo para, por exemplo, ser potencialmente útil na produção de novos medicamentos contra um determinado tipo de doenças? Estas são questões retóricas com impacto na estratégia de pesquisa de novas ferramentas com utilidade humana, tendo por base a investigação biológica. É claro que o conhecimento é tão vasto que é praticamente impossível delinear essas estratégias, exceptuando as óbvias de, como já referi aqui, pesquisar organismos hipertermofílicos para isolar enzimas úteis em processos industriais ou laboratoriais que envolvam temperaturas elevadas. Que fazer, por exemplo, no caso de pesquisa de novas drogas contra o cancro? Que propriedades que indiciem inibição de proliferação celular deveremos procurar em organismos nas suas relações ecológicas? Casos bem conhecidos são os do paclitaxel e do taxol que foram descobertos em testes de pesquisa de actividade anticancro de 30000 espécies de plantas (estes foram a partir do teixo que está praticamente extinto em Portugal - Taxus baccata). Aqui a estratégia foi a de pesquisa mais ou menos exaustiva em que se aproveita o facto das plantas serem produtoras de enorme variedade de compostos químicos no seu metabolismo secundário. Há agora uma nova abordagem: a metagenómica. Aqui não há a preocupação de isolamento de clones (em princípio, espécies) a partir do meio ambiente e depois pesquisar genes. O que se faz é pesquisar directamente os genomas do ambiente sem se saber a que espécie pertencem (bom, por análise de sequências de rRNA, por exemplo, pode-se chegar a saber). Mas a questão mantém-se: a partir de que ambientes se deve fazer esta abordagem com o fim de obter genes úteis no combate ao cancro (os exemplos anteriores aplicam-se também aqui, ou seja, se fizer uma abordagem metagenómica numa fonte hidrotermal obterei genes com interesse em aplicações que envolvam temperaturas elevadas).

O caso da Salinispora tropica é exemplar. Foi isolada originalmente de sedimentos marinhos nas Bahamas e verificou-se ser produtora de compostos promissores no tratamento do cancro (nomeadamente a salinosporamida A, já em ensaios clínicos). A pista que revela o seu interesse como potencial fonte de compostos com actividade farmacológica vem do seu genoma: tem uma proporção anormalmente elevada de genes envolvidos na produção de compostos com acitividade antibacteriana e anticancro (10% contra os normais 6-8%).

sábado, junho 23, 2007

powers of 10 (thesimpsons)

Cool!!! O universo na cabeça do Homer Simpson!

domingo, junho 17, 2007

Estranhos seres vivos do planeta Terra

Foto: Henry Aldrich
Temperatura óptima de crescimento: 100ºC; pressão ambiente óptima: 200atm. O seu nome é de meter medo: Pyrococcus furiosus. Ok, o pH óptimo é 7, o que é uma coisa "normal" que destoa com as condições de temperatura e pressão. Como se não bastasse, há mais uma condição extrema que este organismo consegue suportar: elevadas doses de radiação. O nome reflecte a elevada taxa de crescimento desta arquebactéria, apenas 37 minutos em condições ideais. O facto da pressão ser elevada faz com áquela temperatura a água não entre em ebulição e a temperatura faz com que não haja praticamente oxigénio dissolvido. É um anaeróbio obrigatório e foi originalmente isolado a partir de sedimentos marinhos aquecidos junto à ilha italiana de Vulcano. O seu genoma já foi sequenciado; tem 1.908.256 nucleótidos, 2.125 genes codificantes de proteínas e 103 genes de RNA.

As suas enzimas são termofílicas o que as faz potencialmente úteis em biotecnologia. A sua DNA polimerase, Pfu DNA polimerase, é usada em PCR. É termostável como a Taq DNA polimerase (de Thermus aquaticus, um organismo também termofílico) mas copia o DNA com mais fidelidade (1,3e-6 contra 8,0e-6; em frequência de mutação/par de nucleótidos/duplicação). Embora seja mais lenta (1-2 minutos por 1000 nucleótidos) que a Taq DNA polimerase, a Pfu faz parte das enzimas de elevada fidelidade de cópia, sendo por isso aplicada em clonagem.

Aposto que há muitos locais no Sistema Solar óptimos para este organismo.

terça-feira, junho 12, 2007

Ambiente alienígena

A iniciativa Café Scientifique de discutir assuntos científicos em ambiente "não científico", como em bares e cafés, tem seguidores em Braga (parece que é o único da Península Ibérica). Parece-me estimulante fazer discussões científicas fora do ambiente formal dos bancos da universidade. Foi o que aconteceu ontem dia 11 no estaleiro cultural Velha-a-Branca com o convidado Hernâni Maia do Departamento de Química da Universidade do Minho e o tema pelo qual tem dedicado os seus estudos: vida alienígena.

Foi um serão excelente a recordar os sonhos de Carl Sagan, os devaneios de Fred Hoyle, o fascínio de Marte e dos marcianos no nosso imaginário e o confronto de ideias na história da ciência. Foi o primeiro em que participei e tenciono não perder mais nenhum.

domingo, junho 10, 2007

11 anos de pós-genómica

André Goffeau
Numa conferência integrada num curso avançado do Departamento de Biologia da Universidade do Minho, André Goffeau o "pai" da sequenciação do genoma de levedura fez uma descrição de todo esse projecto de sequenciação terminado há 11 anos (tempos heróicos em que as informações ainda eram trocadas por via postal). É interessante verificar, como o próprio referiu, a felicidade de uma decisão que se revelou acertada a posteriori na escolha do organismo para sequenciar. Só depois da sequenciação (obviamente) é que se ficou a saber que o genoma é compacto (a proporção de genes em relação às regiões intergénicas, muitas vezes repetitivas, é elevada), praticamente não tem intrões e é relativamente pequeno (cerca de 6000 genes verificáveis facilmente devido à ausência de intrões). Esta simplicidade do genoma em comparação com o de outros eucariontes só poderia ser suspeitada com base na sequência dos poucos genes sequenciados até à data do início do projecto. Há decisões acertadas mesmo que muitas vezes não sejam totalmente apoiadas em factos (a adicionar aos genes conhecidos seriam as vantagens "clássicas" de facilidade e baixo custo de cultivo em laboratório, bom conhecimento da fisiologia, bioquímica e genética) que proporcionaram o sucesso da sequenciação. Como Goffeau referiu também, se se tivessem aventurado na sequenciação do genoma humano, muito provavelmente não teriam tido sucesso. Aliás, ainda hoje, o genoma de Saccharomyces cerevisiae é o único totalmente sequenciado.

terça-feira, junho 05, 2007

Dois meses

Foto: National Library of Medicine
Foi o tempo necessário para sequenciar o genoma de James Watson num projecto simbólico que dará início à democratização da sequenciação de genomas (ou como vem no artigo da Nature: "personal genomics"). Este projecto custou menos de 1 milhão de dólares. Daqui a poucos anos até eu terei dinheiro suficiente para encomendar a sequenciação do meu genoma.

quinta-feira, maio 31, 2007

Vida em Marte

Foto: NASA
Se houver vida em Marte será de organismos seleccionados para o ambiente inóspito daquele planeta (do ponto de vista antropológico). Alguns dos ambientes terrestres são comparáveis ao planeta vermelho no que diz respeito à ausência de água, temperatura e química do solo. Organismos isolados destes ambientes terrestres poderão ser viáveis no ambiente marciano o que sugerirá a possibilidade de presença de vida em Marte. Esta é a hipótese de trabalho do grupo de Tim Kral da Universidade do Arkansas que, numa série de experiências simples, cultivaram diferentes espécies de arquebactérias metanogénicas em diferentes substratos inorgânicos (areia, argila, basalto e uma mistura simuladora de solo marciano) na presença de hidrogénio e dióxido de carbono. O resultado foi a produção de metano em todas as culturas (excepto argila) o que indica a actividade metabólica destas bactérias, ou seja, a presença de metanogénios vivos.

Isto não é muito surpreendente uma vez que desde 1990, Woese já havia proposto a criação do reino Archaea que engloba as arquebactérias que partilham, entre outras características, a extremofilia (adaptação a ambientes extremos como salinidade, calor, acidez e pressão). O potencial biotecnológico destes seres é enorme devido ao facto das suas enzimas estarem também adaptadas para uma actividade óptima na condição ambiental extrema (o caso da temperatura é o mais elucidativo, uma vez que não será possível a uma célula alterar a temperatura intracelular para fazer face a um ambiente de 90ºC; o que já não se poderá dizer da salinidade em que a concentração intracelular, se bem que elevada, será menor que a ambiental). Um exemplo da rotina laboratorial em genética e biologia molecular é a enzima termofílica Taq DNA polimerase usada no PCR.

Em suma, se há vida em ambientes extremos na Terra, nada impede que haja vida em ambientes extraterrestres (extremos ou não). O que Karl e colaboradores mostraram é que amostras de substratos semelhantes ao solo marciano permitem o desenvolvimento de organismos vivos. Por isso a presença de microrganismos em planetas com ambientes muito diferentes do nosso é previsível. Quanto à vida inteligente, isso é outra história. Organismos vivos inteligentes pressupõem multicelularidade, comunicação celular, fluídos para transportar nutrientes e moléculas mensageiras. Ambientes extremos como temperatura e pressão osmótica afectam as propriedades físicas dos fluídos, agregação celular e, por exemplo, a conductividade eléctrica. A não ser que estas formas de vida sejam baseadas noutra substância que não a água...

sexta-feira, maio 25, 2007

Stanley Miller (1930-2007)


A partir da sua famosa experiência a origem da vida passou a ser um assunto sério (ver aqui).

sexta-feira, maio 18, 2007

Microfluídica multiplex

Nos métodos multiplex baseados em arrays as sondas são identificadas pela sua posição fixa no suporte. Nos métodos baseados em suspensões as sondas são identificadas pela ligação a uma partícula que está marcada com um código único. As vantagens desta tecnologia é a dinâmica das soluções ser respeitada no ensaio e teoricamente ser possível ter uma escala maior de ensaios multiplex.

O grupo de Patrick Doyle do MIT desenvolveu um sistema que permite produzir micropartículas de polietilenoglicol com duas regiões; uma para identificação com um código semelhante a um código de barras (passível de ser lido por um aparelho análogo a um citómetro de fluxo) e outra de detecção do analito. Assim, poderá vir a ser possível usar uma mistura de milhões destas partículas para detectar DNA, RNA, proteínas e metabolitos com as quais possam interagir, tudo num só ensaio num curto período de tempo (Pregibon, D.C. et al., Multifunctional encoded particles for high-throughput biomolecule analysis. Science 315: 1393-1396 2007).

A análise biológica em larga escala, os omics, não tarda muito em fazer parte das nossas vidas.

terça-feira, maio 15, 2007

Levedura modelo

Foto: Maxim Zakhartsev and Doris Petroi, International University Bremen, Germany

Novamente a levedura a servir de modelo científico em problemas científicos fundamentais em biologia. Depois de, por exemplo, ter sido escolhida como primeiro organismo para sequenciação do genoma e para a análise à escala genómica dos níveis de transcrição génica por microarrays, a levedura surge também como organismo modelo na emergente área da biologia de sistemas. Neste caso o problema da regulação do crescimento celular foi analisado a nível da transcriptómica, proteómica, endometabolómica e exometabolómica. Sem surpresas, a maior parte dos genes positivamente regulados com o aumento da taxa de crescimento têm ortólogos noutros organismos, incluindo humanos.

quinta-feira, maio 10, 2007

Não é só o conteúdo que é importante

Foto: US National Library of Medicine

Um artigo interessante
(Moore. 2000. Writing about biology: how rhetorical choices can influence the impact of a scientific paper. Bioscene 26:23-25), em que se faz a comparação dos estilos de escrita de dois artigos que marcaram a história moderna da biologia, permite constatar a importância do modo de relatar os resultados no impacto das descobertas. Os artigos analisados são Watson, J.D. and F.H.C. Crick. 1953. Molecular structure of nucleic acids: a structure for deoxyribose nucleic acid. Nature 171:737-738 (disponível para download aqui) e Avery, O.T. , C.M. MacLeod, and M. McCarty. 1944. Studies on the chemical nature of the substance inducing transformation of pneumococcal types. Journal of Experimental Medicine 79:137-158 (disponível para download aqui).

O reconhecimento atingido por Avery e colaboradores não faz de facto justiça ao seu contributo científico dos resultados relatados no artigo de 1944. Imagino que possa haver mais explicações (confesso que a estrutura molecular do DNA é muito mais apelativa do que uma série de experiências em que se misturam extractos de bactérias com bactérias vivas, injecções em ratinhos e análise da sua sobrevivência) mas a comparação dos dois artigos no que diz respeito à extensão do artigo, nível de detalhe, confiança dos autores que transparece do texto, poder de argumentação e poder de persuasão revela uma maior consciência comunicacional por parte de Watson e Crick. Como exemplo reparem nos títulos dos dois artigos; o de Watson e Crick é afirmativo e inclui a mensagem principal enquanto que o de Avery e colaboradores é vago e não refere sequer o DNA.

domingo, abril 15, 2007

Actividade eléctrica de uma só célula

Esta técnica pode ter enorme aplicação na fisiologia celular e, como referem os autores, no ensaio dos efeitos celulares de novas drogas. No entanto ainda falta bastante para saber o significado biológico dos "10 electrões em movimento" detectados após a adição de álcool para que se possa usar esta detecção da actividade eléctrica de uma só célula, levedura, na investigação aplicada. Este é também um produto típico das notas de imprensa de instituições científicas em que se faz a divulgação de algo potencialmente importante ainda sem grande significado científico.

sexta-feira, abril 13, 2007

Portugal mais pobre


Hoje no Público: "Comerciante espanhol devastou centenas de zimbros no Parque Natural do Douro". Em subtítulo: "Espécie não é protegida em Portugal, ao contrário do que acontece no país vizinho, onde tem elevado valor comercial".

Se os zimbros andassem fariam como os linces; mudavam-se para Espanha!

E agora é preciso ter juizo!


Em 1967, no rescaldo da descoberta do código genético, Marshall Nirenberg discute (Nirenberg, M. 1967. Science 157) se a sociedade estará preparada para as novas perspectivas na manipulação genética que se abriram com este marco histórico. É um encanto ler alguns exemplos avançados destas novas perspectivas, mesmo num registo muito realista. Já na altura se discutia que a ciência andava depressa demais para o exercício do poder conferido por avanços científicos não ser contrabalançado por condições sociais favoráveis. Daí a pergunta: "will society be prepared?"

segunda-feira, abril 09, 2007

Clatrina


A PDB (Protein Data Bank) é uma base de dados valiosíssima sobre macromoléculas, permitindo o acesso livre a estruturas e outra informação científica. Para além de recursos educacionais excelentes (ver exemplo aqui), tem uma secção dedicada à molécula do mês. Abril é o mês da clatrina (já abordada na Biologia Molecular e Celular da Engenharia Biomédica ; já não falta muito para a Engenharia Biológica). Nesta secção encontra-se uma descrição didática da molécula ilustrada com gráficos informativos . Vale a pena pesquisar as moléculas dos meses anteriores e ir acompanhando as que estão para vir.
Imagem: Graham T. Johnson e David S. Goodsell (para comparação, a vermelho está representada a hemoglobina)

sexta-feira, março 30, 2007

Molecular approaches to cancer research


For those interested in cancer research involving the comet assay, heat shock proteins, epigenetics, genotoxicity and chemoprevention by natural compounds this workshop might be helpful. The course will take place at the Department of Biology of the University of Minho in Braga, Portugal, 1-4 May 2007. For more information visit this site or contact me.

quinta-feira, março 29, 2007

Revisão da matéria dada


Das aulas teórico-práticas da Engenharia Biomédica esta animação incluida no Lodish.

segunda-feira, março 26, 2007

Ligando e receptor


O caso específico de endocitose mediada por receptor de lipoproteínas de baixa densidade (LDL) numa animação didática que vale por mil palavras.

quarta-feira, março 21, 2007

Saudades da colecção Argonauta


Ao ler o post de 18 de Março do Osame no SEMCIÊNCIA deu-me vontade de "atacar" de novo a literatura de ficção científica. A falta de tempo e o aumento na diversidade de gosto literário (a banda desenhada e a "literatura séria", por exemplo) provocou um abrandamento no consumo da ficção científica.

Uma sugestão para quem quiser meter-se na ficção científica: Galáxias como grãos de areia de Brian Aldiss (o que eu li não é da lendária colecção Argonauta, nem corresponde à edição da imagem; é da Editorial Caminho).

terça-feira, março 20, 2007

Sugestões para os tempos livres

Para a Engenharia Biológica uma animação ilustrativa da quiralidade e outra das reacções de esterificação de ácidos gordos com o glicerol (também não faz mal nenhum explorar o resto desta página para rever os lípidos).

Para sedimentar conhecimentos


Esta animação interactiva sobre transporte transmembranar para os alunos de Engenharia Biomédica.

domingo, março 18, 2007

Construir vida

As duas abordagens da biologia sintética (um ramo emergente da biologia, resultando dos avanços enormes recentes da bioinformática, genómica e biologia molecular) estão resumidos no editorial da Bioinformatics (Lorenzo et al. 2006. 22: 127-128). São elas a desconstrução (o que parece paradoxal) e a construção. A desconstrução baseia-se no estudo de partes de sistemas biológicos após o seu isolamento. De facto, aparentemente isto é paradoxal pois para isolar componentes de um sistema complexo estou a analisar e não a fazer síntese. No entanto, em termos conceptuais o conhecimento do comportamento das partes permite "construir" (síntese) o sistema complexo. Na construção há a combinação de componentes autónomos modulares para a criação de sistemas que imitam as propriedades dos sistemas biológicos. Uma manifestação desta abordagem pode ser encontrada aqui onde estão registados componentes que poderão ser utilizados nesta abordagem (é como recorrer a um catálogo de peças de uma marca automóvel e escolher as peças que me interessam para construir um determinado carro; há mesmo um tipo de peças denominado chassis com possibilidade de escolha entre E. coli, levedura e mamífero!). Há uma variante na abordagem da construção que é a síntese de pequenos genomas com o objectivo de criar sistemas simples com comportamento facilmente previsível e que poderão ter utilidade industrial e até na ciência não aplicada como na investigação sobre a origem da vida (aliás como toda a biologia sintética como parece evidente pela possibilidade de desenhar sistemas simplificados e pela compreensão das partes dos sistemas biológicos).

quarta-feira, março 14, 2007

Earth attacks!


É a nossa resposta à invasão dos marcianos ao nosso planeta presente no nosso imaginário devido a H.G. Wells, Orson Welles, mais uma série de filmes de série B (e Z como os de Ed Wood), muita banda desenhada e, mais recentemente, por Tim Burton. Um pouco à semelhança do filme Mars Attacks!, já poderemos ter provocado também uma mortandade de indígenas. Os exploradores Spirit e Opportunity já fizeram 3 anos de exploração em Marte e parece que estão para durar.

quarta-feira, março 07, 2007

Assassino de bactérias


Uma animação do "ataque" do bacteriófago T4 para ilustrar o capítulo de seres subcelulares da Engenharia Biomédica. Os detalhes do processo de injecção do DNA são fantásticos.

terça-feira, março 06, 2007

Propriedades da água


Com o recomeço da actividade lectiva, regressam os posts didáticos. Este é especialmente dedicado à Engenharia Biológica e é um belo exemplo de uma apresentação científica rigorosa e didática aliada à estética.

domingo, março 04, 2007

Mergulho na sombra



Com chuva e num céu nublado, típicos de Braga no Inverno, ainda foi possível ver o eclipse da Lua.

sexta-feira, março 02, 2007

Image of the day

A imagem domina a nossa sociedade. O poder de sedução e de transmissão de informação de uma imagem é ilimitado. Na era da informação online via internet e de comunicações móveis a imagem já deixou de ilustrar a informação para ser ela própria informação. Sites como o Astronomy Picture of the Day são como uma oração diária em que, em breves instantes, viajamos no espaço, entramos em engenhos espaciais, corpos celestes e contactamos "directamente" com a exploração espacial. No blogue Living the Scientific Life há uma secção de imagem do dia constituida por fotografias cedidas por leitores que são publicadas diariamente. Isto é no fundo um fotoblogue dentro de um blogue, conferindo-lhe uma dimensão nova pela participação directa dos leitores e pelo leque alargado de paisagens, seres vivos ou situações retratados que seriam difíceis de atingir se não houvesse tantos leitores a contribuir. Num blogue português bem conhecido passa-se o mesmo fenómeno com séries de fotografias temáticas (Espaços Onde se Pode Respirar, Jardins de Inverno, etc).

Algumas das fotografias do Living the Scientific Life são do outro mundo. Quer dizer, do nosso planeta mas extraordinárias.

quinta-feira, março 01, 2007

O relojoeiro cego


Confesso que ainda não o tinha lido. Não me lembro de ter lido nenhum livro ou texto que fosse tão claro na defesa do evolucionismo (e ainda vou no capítulo 3). Acho mesmo que toca na verdadeira essência do equívoco em que caem os detractores do darwinismo. Esta passagem do início do capítulo 2 acho que diz quase tudo:

Natural selection is the blind watchmaker, blind because it does not see ahead, does not plan consequences, has no purpose in view. Yet the living results of natural selection overwhelmingly impress us with the appearance of design as if by a master watchmaker, impress us with the illusion of design and planning.

Mas o que deixa também claro é que a selecção natural é tudo menos casual. Aqui continua a deitar por terra muitos dos argumentos clamando contra a improbabilidade do aparecimento de seres vivos tão complexos com base na selecção natural (se esta fosse por processos puramente casuais). O facto, como Dawkins refere, é que casual são as variações genéticas, sendo a selecção natural dirigida para as variações favoráveis (e possíveis pelas leis da física). Assim se explica o aparecimento de órgãos complexos (como o olho, uma asa) formado por alterações graduais, cada uma delas favoráveis, o que provoca uma restrição no universo de soluções possíveis em termos de variações genéticas quando um órgão já possui uma determinada função. É este o relojoeiro cego, ou seja, a selecção natural.

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

"And you have burned so very very brightly, Roy"


A questão da libertação para o ambiente de organismos geneticamente modificados é naturalmente uma questão com impacto na sociedade devido ao perigo potencial de transmissão horizontal de genes para organismos selvagens. Uma maneira de abolir a proliferação daqueles é a de programar geneticamente o seu suicídio. Já foram criados sistemas com genes que codificam proteínas que promovem a degradação da parede celular ou da membrana plasmática e que são activados por determinadas condições ambientais. Neste artigo de Andrea Balan e Ana Clara G. Schenberg da Universidade de São Paulo, é caracterizado um destes sistemas que difere pelo facto da proteína tóxica ter como alvo o DNA. Teoricamente, estes sistemas serão muito mais eficazes na prevenção da transferência horizontal de genes por razões óbvias. Na realidade, Balan e Schenberg demonstram elegantemente isso mesmo (num post anterior fiz referência a uma investigação que poderá contribuir para esta estratégia de segurança nos mutantes).

Ao ler esse artigo, veio-me logo à memória a obra de ficção científica Do Androids Dream of Electric Sheep?, de Philip K. Dick e adaptada ao cinema por Ridley Scot, precisamente devido à questão existencial dos andróides provocada pela limitação de tempo de vida programada durante o seu fabrico. O diálogo entre Roy, a melhor criação de Tyrell, e o seu criador é belíssimo, com uma atmosfera bíblica em que a criatura questiona o criador no momento da sua "crucificação" após ter cumprido a sua missão:
...
Roy: It's not an easy thing to meet your maker.
Tyrell: And what can he do for you?
Roy: Can the maker repair what he makes.
Tyrell: Would you like to be modified?
Roy: Stay here. -- I had in mind something a little more radical.
Tyrell: What-- What seems to be the problem?
Roy: Death.
Tyrell: Death. Well, I'm afraid that's a little out of my jurisdiction, you--
Roy: I want more life, fucker.
Tyrell: The facts of life. To make an alteration in the evolvment of an organic life system is fatal. A coding sequence cannot be revised once it's been established.
Roy: Why not?
Tyrell: Because by the second day of incubation, any cells that have undergone reversion mutations give rise to revertant colonies like rats leaving a sinking ship. Then the ship sinks.
Roy: What about EMS recombination.
Tyrell: We've already tried it. Ethyl methane sulfonate as an alkylating agent a potent mutagen It created a virus so lethal the subject was dead before he left the table.
Roy: Then a repressive protein that blocks the operating cells.
Tyrell: Wouldn't obstruct replication, but it does give rise to an error in replication so that the newly formed DNA strand carries the mutation and you've got a virus again. But, uh, this-- all of this is academic. You were made as well as we could make you.
Roy: But not to last.
Tyrell: The light that burns twice as bright burns half as long. And you have burned so very very brightly, Roy. Look at you. You're the prodigal son. You're quite a prize!
Roy: I've done questionable things.
Tyrell: Also extraordinary things. Revel in your time.
Roy: Nothing the god of biomechanics wouldn't let you in heaven for.


terça-feira, fevereiro 20, 2007

A ciência na Web 2.0

Serão os editores de jornais científicos os pioneiros da Web 2.0? Serão o Youtube, o Flickr, a Science e a Nature os paradigmas da nova Web? Uma reflexão interessantíssima no Biocurious sobre o posicionamento dos editores científicos na nova Web, na qual é destacado justamente o papel da PLoS ONE em oposição ao resto da indústria da publicação científica.

"Daisy"


Com uma plataforma molecular capaz de fixar fragmentos de DNA e proteínas funcionais que actuem nesses fragmentos e com recurso à tecnologia de microssistemas de fluxo, o grupo de Bar-Ziv, da Weizmann Institute of Science em Israel, expressou dois genes colocados em bandas alternadas num destes chips biónicos em que um deles codifica uma proteína que é necessária para a produção da proteína codificada pelo outro gene. A possibilidade de desenhar sistemas com a colocação de genes fisicamente próximos e associados por relações de interdependência de actividade pode assim permitir criar chips complexos como por exemplo fábricas bioquímicas em ambiente não celular e módulos de integração de informação que poderão vir a constituir biocomputadores.

Bar-Ziv e colaboradores chamaram a este sistema molecular "daisy". O imaginário dos cientistas às vezes é insondável, mas neste caso parecem ter exagerado. É certo que não cairam na situação clássica de designações baseadas na mitologia grega, mas chamar o nome de uma florzinha a um sistema que poderá ser a base de seres biónicos é como imaginar o Arnold Schwarzenegger com uma margarida colocada numa orelha enquanto dispara a espingarda de canos serrados. A não ser, como suspeito, que o nome tenha sido inspirado pela forma do chip ou outra característica importante.

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

Biologia em imagens

Os premiados da competição Olympus BioScapes Digital Imaging de 2006, um concurso anual da Olympus de microfotografias de biologia, foram publicados na Scientific American. Custa a crer que estas fotografias não são coloridas digitalmente (pelo menos aquelas em que há referência explicita à técnica de fluorescência).

Obrigado ao nobelium
pela indicação; co-autor do Electro:n onde se divulga boa música em podcasts.

Previsões científicas

Alguns cientistas fazem previsões a curto prazo nas áreas em que são líderes. Destaco a evolução humana e doenças infecciosas com o progresso no conhecimento do genoma humano; a astrobiologia (em 2007 a tecnologia humana estará a operar simultaneamente em 5 planetas, incluindo a Terra) e a excitante perspectiva de encontrar formas de vida extraterrestres; e a genómica sintética. Neste caso Drew Endy do MIT apresenta cenários bem definidos como a síntese de fragmentos de DNA com 15.000 nucleótidos a 0,5 dólares/base e a montagem de moléculas de DNA de 10.000.000 pares de bases. Depois destas marcas atingidas ficará ao dispor a possibilidade de criar organismos procarióticos e cromossomas de eucariontes. À rotina actual de encomendar oligonucleótidos para a investigação, juntar-se-á a de encomendar moléculas de 15.000 pares de bases ou de 10.000.000 para tentar criar um organismo com um comportamento previsível.

Vai ser interessante.

terça-feira, fevereiro 13, 2007

Células brilhantes


Tomei conhecimento através do excelente SEMCIÊNCIA de Osame Kinouchi de um video fascinante do início do desenvolvimento embrionário de Drosophila melanogaster. O video ganhou o primeiro prémio de video do concurso de 2006 de arte da ciência da Universidade de Princeton. A dinâmica e sobretudo o sincronismo das divisões celulares estão aqui evidenciadas graças à marcação fluorescente das histonas.

A tecnologia de marcação de fluorescência e de microscopia de fluorescência têm permitido ver coisas espantosas em biologia celular. Um exemplo é o emprego de "spectral unmixing", um algoritmo que, aplicado a imagens obtidas com microscopia de fluorescência, permite a discriminação dos diferentes componentes do sinal, possibilitando a identificação simultânea de fluorocromos diferentes na mesma amostra. Isto pode levar a técnicas de diagnóstico relativamente simples e não invasivas como parece indicar este trabalho de análise da autofluorescência resultante do cofactor FAD de cardiomiócitos de rato.

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

Cometas


Embora este não seja um dos típicos (não deixando de ser deslumbrante; ver aqui também o cometa McNaught), é pela semelhança de aspecto que se denomina cometa ao ensaio laboratorial a uma célula com danos no DNA submetida a electroforese em condições que permitam a migração do DNA sem que o envelope nuclear e a membrana plasmática constituam um obstáculo (a foto representa um destes "cometas"). Bom, em rigor, designa-se Single-Cell Gel Electrophoresis, ou electroforese em gel de uma célula (como sempre a designação inglesa soa melhor embora, admito, possa ser preconceito meu). O ensaio baseia-se na área de dispersão do DNA genómico quando sujeito a um campo eléctrico; quanto mais extensos forem os danos (através da quebra de uma ou das duas cadeias do DNA), maior a área da cauda do "cometa". Assim, numa condição limite de ausência de danos, a célula evidenciará ausência de cauda. Pela simplicidade de execução e versatilidade de aplicação a amostras de células, permitindo o tratamento com compostos que induzem danos e também com compostos protectores do DNA antes do ensaio, é um teste útil na pesquisa de novos fármacos e de estudos toxicológicos.

quinta-feira, fevereiro 08, 2007

Aqui não deve haver vida


No topo da atmosfera a 100km de altitude.
Foto: NASA

terça-feira, fevereiro 06, 2007

Aroma de levedura


Não será razão para comer menos e tapar o nariz sempre que sentimos o cheirinho de boa comidinha, mas as moscas do vinagre parecem beneficiar, em termos de tempo de vida, com a restrição calórica e com a ausência do odor do seu alimento preferido (a levedura). A restrição calórica tem sido já discutida há algum tempo, agora a questão do cheiro do alimento é nova. O que poderá estar em causa é o sinal para a execução de tarefas de manutenção do organismo e de preparação para restrição alimentar que a falta de detecção de alimento (por via do olfacto) pode provocar. Isto é coerente com a descoberta de que mutantes da mosca afectados nos receptores de olfacto também beneficiam de um prolongamento do seu tempo de vida; o estímulo para a manutenção e preparação do organismo para tempos difíceis seria permanente. No entanto, há outra hipótese, não contrariada pelas observações, que é a possibilidade das leveduras poderem emitir alguma substância com um efeito fisiológico relacionado com o tempo de vida das moscas. Outra ainda é a da possibilidade das estirpes laboratoriais serem seleccionadas para reprodução precoce, encurtando o seu tempo de vida de maneira a que este tipo de experiências tenha resultados exagerados e sejam de significado biológico limitado.

Foto: André Karwath

domingo, fevereiro 04, 2007

Para evitar que o feitiço se vire contra o feiticeiro


A grave resistência a antibióticos constitui um assunto fundamental de saúde pública e um problema científico interessantíssimo (reparem na ausência de microrganismos em redor de algumas colónias na fotografia) para o qual fui chamado à atenção, através de um comentário na Molecular Microbiology sobre um problema que lhe é directamente relacionado: a resistência dos organismos produtores de antibióticos ao próprio antibiótico que produzem. Em termos puramente conceptuais as estratégias a seguir para este tipo de protecção incluiriam a modificação da molécula de antibiótico de modo a atenuar ou a perder reversivelmente a sua actividade (enquanto não é segregado da célula), modificação do alvo para que a ligação com o antibótico passe a ser de baixa afinidade e garantir que o antibiótico acabado de ser produzido nunca atinja concentrações tóxicas no interior da célula através, por exemplo, de um sistema de transporte na membrana plasmática que exporte o antibiótico. De facto já foram identificados estes mecanismos em estirpes bacterianas produtoras de antibióticos. No caso do transportador do antibiótico, actuando como exportador, há uma função dupla de protecção e de disseminação do antibiótico para actuação no ecossistema, possibilitando a eliminação de competidores. A regulação temporal da expressão de genes tem também importância. Normalmente a produção do antibiótico ocorre em fases tardias do ciclo de crescimento da comunidade bacteriana, enquanto que os genes responsáveis pela resistência são expressos em fases mais precoces.

Enquanto que na resistência adquirida de uma estirpe a um determinado antibiótico pode ocorrer via transferência horizontal de genes (mediado por plasmídeo ou bacteriófago; o mundo científico também é pequeno!), ou seja a posteriori, este tipo de relações ecológicas microbianas não faz sentido quando a protecção é contra uma característica do próprio organismo, ou seja, a produção do antibiótico e a respectiva resistência tiveram que ser seleccionadas simultaneamente. Notavelmente, os genes da biossíntese de antibióticos estão ordenados num agrupamento contínuo no cromossoma, incluindo pelo menos um gene de resistência e, frequentemente, um regulador dessa via de biossíntese, sugerindo que todo o este bloco genético existe como uma unidade funcional e, como tal, susceptível a selecção natural.

Um mecanismo molecular de regulação da expressão dos genes envolvidos neste tipo de protecção é por ligação do antibiótico a um repressor da expressão desse(s) gene(s). Isto faz com que o repressor perca afinidade para a RNA polimerase, podendo assim ocorrer transcrição. O que acaba de ser demonstrado é que formas precursoras do antibiótico podem exercer este mesmo efeito de repressão do repressor (designado pelos autores por "feed-forward"), possibilitando a desrepressão do gene que codifica para o transportador responsável pela exclusão desse antibiótico. Neste sistema, a garantia de protecção é total: a forma precursora inactiva do antibiótico induz a adaptação de protecção contra a sua forma activa.

Foto: Alexandra Nobre, Departamento de Biologia da Universidade do Minho.

quarta-feira, janeiro 31, 2007

Por outro lado...

Uma visão oposta à exposta no post anterior surge numa carta (Nature 444, 31; 2006) dirigida à Nature em que Fenchel, Esteban e Finlay defendem o estudo das propriedades fenotípicas dos micróbios em detrimento da determinação das sequências genéticas para a compreensão da diversidade microbiana na natureza. Isto surge na sequência duma comunicação de Rothschild, também à Nature (Nature 443, 249; 2006) num tom bem mais frontal, apelando à honestidade intelectual na escrita de artigos através da referência aos micróbios recalcitrantes simplesmente como de cultura não conseguida ou não tentada. É muito frequente este tipo de erros, o que leva a pensar que muito do trabalho de revisão dos artigos propostos para publicação não passa de rotina. De facto há uma enorme diferença entre microrganismo não cultivável e mircorganismo de cultura laboratorial mal sucedida com os recursos usuais em microbiologia. Em rigor é disto que se trata sempre.

Há também aqui um espírito de "defesa do meu quintal"; se por um lado há modas que levam praticamente uma comunidade científica inteira a explorar um problema científico pela mesma abordagem (por causa duma tecnologia mais recente e inovadora - o último grito! - e/ou no posicionamento estratégico de captação de financiamento exibindo actualização tecnológica e científica), por outro tenta-se defender as abordagens tradicionais clássicas duma maneira fechada à inovação. Aquilo que me parece é que se vai passar a mesma história de sempre, ou seja, os "clássicos" vão ganhar com as novas metodologias, em termos de novo conhecimento e da inovação na abordagem científica, e os "inovadores" vão precisar dos "clássicos" para analisar e validar as suas abordagens. Afinal, quando se isola um gene não tem que se perguntar qual é a função da proteína que codifica?

quinta-feira, janeiro 25, 2007

O triunfo de Lamarck?*

Se se isolar e sequenciar DNA de solo colhido de uma fonte hidrotermal, devem-se identificar genes que codificam para proteínas com potencial em termos de resistência a temperaturas elevadas (as aplicações biotecnológicas destas proteínas são enormes na investigação, clínica, indústria alimentar, indústria química, etc). Esta é a abordagem metagenómica; estudo de genomas obtidos a partir de amostras de fontes naturais (habitats de microrganismos). Se a abordagem é com um fim de aplicação biotecnológica, nem é preciso ter-se o trabalho de identificar os organismos a que pertencem os genes identificados. Aliás, mesmo para estudos fundamentais, a visão de que há genes que são partilhados por genomas de espécies diferentes numa comunidade microbiana (transferência horizontal de genes) está a ter forte aceitação. Um dos exemplos é a publicação na Nature de um pequeno ensaio anunciando a próxima revolução da Biologia em que o último autor é Carl Woese (esse mesmo, das arquebactérias). Assim, há genes que se transferem livremente entre eubactérias e arquebactérias, entre arquebactérias e eubactérias, entre estirpes de cada um destes grupos filogenéticos e entre vírus e todas as células. Todo este processo é dinâmico e estará dependente das condições ambientais, provocando a mudança de hospedeiro por parte de genes (o triunfo, se é que precisa dele, também é de Richard Dawkins com esta extensão do seu conceito de gene egoísta). Em microbiologia, quando se faz o isolamento de microrganismos em colónias não é mais do que uma análise puramente conceptual da comunidade microbiana de que se parte, pois cada estirpe isolada não fará sentido biológico sem a presença dos restantes membros da comunidade.

No seu ensaio, Goldenfeld e Woese consideram que os primeiros passos evolutivos foram feitos segundo o modelo lamarckiano de transferência genética horizontal, com predomínio sobre o modo vertical, e que o fluxo de genes numa população (em que incluem também energia e matéria) vai abrir campo a uma Biologia mais quantitativa com modelos teóricos com capacidade de previsão, como a biologia de sistemas, fazendo com que se assemelhe com a Física.

*Há também uma referência a Darwin (o título deste post poderia induzir em erro se não o mencionasse) em que os autores refutam a colagem do darwinismo à evolução. Não negando a sua importância, afirmam que outros mecanismos devem ser considerados.


Foto: Galerie des naturalistes de J. Pizzetta, Ed. Hennuyer, 1893

terça-feira, janeiro 23, 2007

Transportador molecular

As nanomáquinas prometem muito. Está aqui um exemplo, com implicações biomédicas evidentes, de uma molécula (a antraquinona) que tem a propriedade de andar numa superfície polida de cobre em linha recta e que ainda tem a capacidade de se ligar a duas moléculas de dióxido de carbono, transportando-as. A equipa de Ludwig Bartels filmou esta caminhada recorrendo ao microscópio "scanning tunneling", que permite detectar correntes eléctricas fracas à escala atómica (0,2 nanómetros) e assim ter imagens de moléculas numa superfície. O resultado é tão fantástico que até é possível ver a dependência da velocidade da antraquinona em relação à carga de dióxido de carbono que carrega (0, 1 ou 2 moléculas).

sexta-feira, janeiro 12, 2007

Estes não são marcianos


A acção microbicida do peróxido de hidrogénio (a água oxigenada das farmácias) está patente nesta placa em que se evidenciam 5 estirpes mutantes da levedura de panificação (cada estirpe ocupa uma linha com diferentes diluições da suspensão celular usada como inóculo; mais diluída da esquerda para a direita) num meio de cultura com peróxido de hidrogénio. Claramente a estirpe do meio é a mais sensível pois é a que forma menos colónias no meio.

É intrigante verificar que este composto existe dentro das células e até é instrumentalizado por células como os macrófagos na sua acção microbicida. O peróxido de hidrogénio está permanentemente a ser produzido (na verdade em todas as células com mitocôndrias e peroxissomas) como consequência da actividade da cadeia respiratória mitocondrial e do metabolismo peroxissomal. Numa situação normal é decomposto a água e oxigénio numa reacção catalisada pela catalase. Quando a produção excede a capacidade de degradação da catalase, o peróxido de hidrogénio reage por oxidação com macromoléculas, particularmente DNA, proteínas e lípidos. Aqui é que começam a surgir os problemas para a célula com degradação de estruturas celulares e alterações do DNA.

Os putativos marcianos referidos por Schulze Makuch, baseiam-se no peróxido de hidrogénio o que confere protecção contra o frio pois o ponto de congelação decresce com o aumento da sua concentração e contra a secura pois é fortemente higroscópico. Assim, nos testes realizados pela Viking no final dos anos 70, em que se adicionava água e carbono radioactivo a solo marciano, os marcianos terão produzido algum CO2 (radioactivo por causa do carbono) e depois morreram por afogamento (o peróxido de hidrogénio intracelular recrutou a água). Deste modo, a produção de CO2 parou subitamente e o material orgânico foi destruido pela libertação do peróxido de hidrogénio das células que rebentaram com a água. Na ficção científica dos filmes dos gloriosos anos 50 e da banda desenhada, a história do contacto com marcianos não era bem assim.