segunda-feira, novembro 27, 2006

Humanização de leveduras



Um dos problemas da produção heteróloga de proteínas, por exemplo a produção de proteínas humanas com potencial terapêutico em microrganismos como bactéria ou levedura, é a diferente modificação pós-tradução, normalmente por glicosilação, que ocorre de modo diferente de organismo para organismo. O padrão de glicosilação de proteínas ainda não está completamente esclarecido, no entanto sabe-se que condiciona a actividade biológica da proteína, podendo masmo ser determinante. Assim, a grande vantagem da produção heteróloga de proteínas humanas em microrganismos (ausência de transmissão de agentes infecciosos, rendimento e economia) pode ser completamente anulada pela ausência de actividade do produto final devido ao padrão de glicosilação ser diferente ou mesmo ausente. Este é o resultado do uso de bactéria como sistema de expressão, pois na ausência de organelos não há as modificações pós-tradução que ocorrem tipicamente no retículo endoplasmático e no aparelho de Golgi.

Um dos microrganismos mais usados na expressão de proteínas de mamífero é a levedura Pichia pastoris devido ao facto de ser metanoltrófica, sendo os genes associados a este metabolismo serem conhecidos e a sua expressão ser regulada pela presença de metanol no meio de cultura. Deste modo, clonando um gene com um promotor para a enzima álcool oxidase (do primeiro passo do catabolismo do metanol), pode-se induzir fortemente a produção da respectiva proteína apenas por transferência das células da cultura para um meio contendo metanol como única fonte de carbono e energia. No entanto, não há só vantagens: o padrão de glicosilação das proteínas de secreção em P. pastoris não é igual ao de células humanas.

Só que as leveduras são excelentes modelos científicos, em particular na manipulação genética em que a introdução de genes de outros organismos é facílima (mais a Saccharomyces cerevisiae, sendo que o superlativo só é justificável em termos relativos por camparação com outros organismos, ou seja, não deixa de ser difícil). Foi assim que Hamilton e colaboradores inactivaram os genes responsáveis pela glicosilação de P. pastoris e introduziram 14 genes heterólogos que permitem recriar os passos da glicosilação humana nesta levedura. Para demonstrar o sucesso, produziram eritropoietina funcional, a hormona glicoproteica responsável pela indução da produção de eritrócitos na medula óssea.

Foto: Peter Hollenhorst e Catherine Fox

quinta-feira, novembro 23, 2006

Nanotecnologia com organismos vivos


A primeira nanomáquina com organismos vivos e partes inorgânicas. Com um rotor revestido com estreptavidina ao qual se associam bactérias da espécie móvel Mycoplasma mobile com proteínas de superfície biotiniladas, foi possível fazer funcionar o rotor (ver vídeo aqui) através duma calha circular produzida por fotolitografia num suporte e revestida com proteínas contendo ácido siálico para restringir o movimento bacteriano (ver aqui também).

O trabalho foi publicado recentemente e poderá marcar o início da utilização de seres vivos como parte integrante de nanomáquinas, como por exemplo microrobots. Bem, apenas a esta escala, pois a utilização de seres vivos em máquinas de escalas maiores é quase tão antiga como a própria civilização.

Foto: Yuichi Hiratsuka, U. of Tokyo/PNAS

domingo, novembro 19, 2006

Science & art por Nuno Micaelo


Nas Jornadas de Biologia Aplicada o Nuno já nos havia brindado com os modelos moleculares da cutinase, representando a proteína com moléculas de água de hidratação em ambientes químicos diversos com previsões exactas da sua actividade catalítica. Outro lado da sua actividade é a arte. As representações gráficas de estruturas moleculares são deslumbrantes.

sábado, novembro 18, 2006

"Baby boom" dos pandas



Parece que o projecto de reprodução em cativeiro do panda gigante está a ser um sucesso. Pode ser assim recuperada uma espécie simbólica com um destino de extinção já anunciado. Faltará depois cuidar do habitat pois, apesar de ser importante manter animais em cativeiro numa perspectiva de educação ambiental e também de investigação, não servirá para nada recuperar espécies sem o seu habitat para ser possível manter populações selvagens. Ora o habitat do panda gigante também está ameaçado e a sua recuperação é difícil. A sua alimentação é à base de bambu que tem um ciclo de vida fora do comum: a floração ocorre simultaneamente em todos os indivíduos e a intervalos de tempo que podem ir dos 20 aos 100 anos, sucedendo-se, depois, a morte. Esta vulnerabilidade do habitat é assustadora, restando a esperança do empenho das autoridades chinesas na manutenção de parques naturais para contrariar a desflorestação galopante num país com crescimento económico vertiginoso.

Outro problema é o da consanguinidade. O cruzamento genético entre um reduzido número de indivíduos pode levar a um elevado grau de homozigotia. A ecologia molecular estuda a diversidade genética em casos como este, usando ferramentas de biologia molecular. Há dados que apontam para uma diminuição da diversidade genética (ver aqui e aqui). Apesar de tudo este pode vir a ser um caso de sucesso e servir de exemplo para outras situações como o lince ibérico.

quinta-feira, novembro 16, 2006

Retrato de família

Ainda não sabemos se deveremos incluir os Neandertais na nossa família; um debate que, como noticia o Público, tem 150 anos. Agora a discussão regressa em força com a publicação da sequenciação e análise de DNA genómico Neandertal. Na Seed vem também uma referência ao assunto, incluindo resultados da análise de sequências genómicas nucleares, em particular de um gene envolvido na regulação do tamanho do cérebro. Nesta análise, o grupo de Bruce Lahn da Universidade de Chicago encontrou uma variante do gene cuja distribuição geográfica predominante (Europa e Ásia) e o tempo de isolamento em relação a outra variante em populações separadas (1 milhão de anos, o que é consistente com a separação dos Neandertais dos humanos modernos), sugerem que houve cruzamento, ou seja, sexo entre neandertais e humanos modernos.

A par da eliminação de uma espécie por outra semelhante, o confronto entre espécies na história natural também pode envolver sexo. Afinal são todos humanos!

sexta-feira, novembro 10, 2006

Genoma sequenciado


Desta vez é o do ouriço marinho (Strongylocentrotus purpuratus).
(Foto: Tomasz Sienicki)

quarta-feira, novembro 08, 2006

A senescência vista do espaço



Todos os Outonos, pelo menos desde que subscrevi o serviço Earth Observatory, a NASA mostra fotografias de regiões dos EUA com maior densidade de árvores caducifólias tiradas no Outono e no Verão. Como se pode ver nas fotografias da NASA, é um espanto!

A questão biológica da caducidade das folhas permanece ainda um mistério. As árvores não são propriamente um bom modelo biológico no que diz respeito à manipulação laboratorial. As hipóteses que se poderão colocar, por exemplo relacionadas com a protecção contra insectos ou contra radiações por parte dos pigmentos que surgem após a degradação da clorofila são, por isso, difíceis de testar. Menos misterioso é o fenómeno celular e molecular da senescência que tem pontos em comum com fenómenos como a morte celular programada (apoptose), especialmente nos danos do DNA (comprimento dos telómeros) que o induzem ou o ataque oxidativo de radicais livres a macromoléculas. Assim, a senescência celular pode ser vista como a paragem na divisão (inibição da progressão do ciclo celular), permitindo que os mecanismos de reparação de DNA, por exemplo, entrem em acção. Se não resolverem o problema, então ocorre apoptose.

domingo, novembro 05, 2006

"Vale a pena ir seguindo o caso" VI

Do FísicosLX, uma conversa de Richard Dawkins com um pastor norte-americano. O final é previsível...
Post didático

Uma animação de um dos manuais aconselhados (Lodish et al., Molecular Cell Biology, Freeman) representando detalhadamente a transcrição, processamento de mRNAs e tradução. Muito útil para se perceber a dinâmica destes processos dentro da célula.

"Vale a pena ir seguindo o caso" V

Agora é uma notícia de um país muçulmano, a Turquia. Tendo em conta que este é o único país muçulmano em que o estado é laico, será de prever que este é o melhor exemplo de ensino oficial de biologia no mundo islâmico. É também perturbadora a referência à sondagem da Science em que aparecem os EUA e a Turquia com menor aceitação do darwinismo, de um universo de 34 países.

sexta-feira, novembro 03, 2006

Jornadas de Biologia Aplicada


São as VIII jornadas que os alunos do 4º ano de Biologia Aplicada da Universidade do Minho organizam. Já estão a fazer história com mais um programa ambicioso. Desta vez darei o meu modesto contributo num painel que promete (Sistemas em Biologia: Moleculares e Celulares).

quarta-feira, novembro 01, 2006

"A Short History of Nearly Everything"


Seria de esperar pelo título uma obra demasiado ambiciosa - do género contar tudo desde o Big Bang até hoje - mas não. Com uma técnica de escrita irrepreensível, bem evidente no fim de cada capítulo, em que adianta um bocadinho do capítulo seguinte para aguçar o apetite e manter a curiosidade sempre viva ao longo da leitura, Bryson descreve as grandes revoluções científicas, com particular destaque para a Física, Geologia e Biologia. Por isto, este livro é uma excelente introdução para os interessados em história da ciência. O que acho que distingue esta obra é a perspectiva com que é contada esta história ao dar ênfase às pessoas (não há praticamente referência a nenhum cientista sem um enquadramento biográfico, muitas vezes com classificações menos abonatórias em termos de qualidades humanas). Também os lados menos visíveis da ciência são aqui referidos sem pudor e que me surpreenderam, como por exemplo as medições que são feitas em astronomia de que resultam, muitas vezes dados pouco robustos (não é só na biologia...). Naturalmente, tal como transparece da obra, não se trata de fraude mas de dificuldades técnicas nas medições ou na raridade de dados como é ilustrado de forma totalmente aberta nos capítulos dedicados à evolução que deu origem ao Homo sapiens.

Para os não entendidos nos assuntos científicos esta obra tem a grande virtude de retratar a ciência e os cientistas sem nenhum tipo de idolatria ou sacralização e sem linguagem técnica avançada. A leitura chega a ser divertida devido ao grande número de hstórias deliciosas como a da opinião de um reputado editor sobre a Origem das Espécies, no Outono de 1859, desaconselhando a publicação com a crítica de que o assunto era demasiado restrito para um público vasto e que Darwin deveria escrever sobre pombos. O livro acabou por ser editado em Novembro e a primeira edição de 1250 cópias esgotou no primeiro dia em que foi posta à venda (nunca esteve sequer fora de edição até hoje!).